Dados em perspectiva histórico-mundial
CWEdata reúne dados de diferentes fontes, estruturados territorial e temporalmente, e que permitem análises em perspectiva histórico-mundial da economia e do sistema internacional.
“Se na Inglaterra é inventada uma máquina que na Índia e na China tira o pão a inúmeros trabalhadores e subverte toda a forma de existência desses impérios, tal invenção torna-se um fato histórico-mundial; ou pode-se demonstrar o significado histórico-mundial do açúcar e do café no século XIX pelo fato de que a falta desses produtos, resultado do bloqueio continental napoleônico, provocou a sublevação dos alemães contra Napoleão e foi, portanto, a base real das gloriosas guerras de libertação de 1813.”
— Karl Mark em A Ideologia Alemã
A economia-mundo capitalista é definida em termos de fenômenos espaciais e temporais.
Não é novidade que existe um esforço para superar as fronteiras disciplinares entre economia, política, sociologia e história. Também não é recente a tentativa de construir uma ciência social historicamente fundamentada. Não obstante, a parte mais difícil dessa tarefa foi, e continua sendo, estabelecer um diálogo entre a economia e as demais ciências sociais, bem como entre as ciências sociais e a história. É nesse diálogo que surge o pertinente e persistente questionamento de qual seria o lugar das fontes informacionais qualitativas e quantitativas. Em especial, sobre o lugar dos dados e dos modelos estatísticos no esforço para superar as fronteiras disciplinares. Ou ainda, se existe um ordenamento adequado para integrar tais fontes?
Nesta mensagem, que inaugura o CWEdata, buscamos responder essas perguntas levando em consideração a necessidade de encaminhar o diálogo entre a economia com as ciências sociais e a história, bem como apontar o papel da matemática e da estatística nesta interlocução. Para tanto, primeiro, exploramos o argumento de Karl Polanyi sobre a falácia economicista. A partir de Celso Furtado, ilustramos as implicações desse sofisma. Para contornar o equívoco argumentativo economicista, recuperamos a contribuição de Fernand Braudel sobre os tempos históricos e sua crítica às ciências sociais. Apontamos, com base em Immanuel Wallerstein, o tipo de estatística que se faz necessário para a construção de perspectivas histórico-mundiais. Por fim, destacamos a importância de se integrar bases informacionais qualitativas e quantitativas disponíveis.Muitos anos atrás, em seu livro A Grande Transformação, Karl Polanyi (2012a [1944]) assinalou que todos os ramos das ciências sociais foram estabelecidos sobre a hipótese de Adam Smith da propensão natural do homem à troca. Para Polanyi, ao partir dessa hipótese, o pensamento social do século XIX desenvolveu a mentalidade de mercado que resultou na falácia economicista, i.e., um erro lógico no qual a economia humana é equiparada com a forma específica do mercado. Na análise do autor, este mal-entendido tem origem na definição formal de economia, a qual, além de isolar a dimensão econômica das demais esferas da vida, a compreende logicamente como relação de meios e fins, em que o agente satisfaz suas necessidades e desejos minimizando os meios. Como resultado, a produção material da vida não só é reduzida a um problema de escassez, mas também é enunciada como uma verdade universal. No entanto, escassez e escolha relativa são, para Polanyi (2012b [1977], p. 72), uma situação especial onde “[…] economizar ou conseguir algo abaixo do preço, refere-se à escolha entre usos alternativos dos meios insuficientes”. Portanto, Polanyi argumentava que o conceito formal de economia induz historiadores econômicos a transplantar esta forma específica de economia para outras sociedades e cientistas sociais a assumir seu significado sem questionamento. A crítica de Polanyi sugere que ambos, cientistas sociais e historiadores, têm compreendido mal o lugar da economia na vida cotidiana e, principalmente, como ela se conecta com as demais esferas da vida. No entanto, é importante reforçar que em nenhum momento Polanyi colocou em dúvida a análise econômica. Seu objetivo era estabelecer os limites históricos e institucionais dos mecanismos de formação de preços nas economias.
Como alternativa, Polanyi propunha uma visão substantiva da economia, na qual a subsistência do homem, a produção material da vida, deveria ser teorizada a partir da relação entre o homem e a natureza e entre o homem e seus pares, podendo ou não envolver a escolha no sentido das escolhas de mercado. A antropologia contribui com a visão de que costumes e tradições podem eliminar o problema de escolha. A partir dela, Polanyi pretendeu transcender as limitações inerentes à análise econômica contribuindo assim para uma teoria geral da organização econômica.
Do nosso ponto de vista, a crítica de Polanyi é bem-vinda. Aceitá-la não significa admitir qualquer superioridade de seu esquema analítico, apenas indica um passo importante no sentido da necessidade eminente de abrir as ciências econômicas. Além de dar importante passo na desconstrução da ciência econômica mainstream, a distinção entre economia formal e substantiva estabelecida por Polanyi se mostra muito útil no processo de estabelecer uma ponte entre as ciências econômicas e as demais ciências sociais e destas com a história. Ela também coloca em dúvida a identificação do caráter científico da economia com a economia positiva. Celso Furtado (1974, p. 113-115), por exemplo, em Objetividade e Ilusionismo em Economia, expôs bem essa limitação:Para que o preço do feijão fosse algo rigorosamente objetivo deveria ser, como se ensina nos livros texto, a resultante da interação de duas forças, a procura e a oferta, dotadas de existência objetiva. Seria o caso, por exemplo, se a oferta de feijão dependesse apenas da precipitação pluviométrica e sua procura das necessidades fisiológicas de um grupo definido de pessoas. Mas a verdade é que a oferta de feijão está condicionada por uma série de fatores sociais com uma dimensão histórica, os quais vão desde a manipulação do crédito para financiar estoques até o uso de pressões para importar ou exportar o produto, sem falar no controle dos meios de transporte, no grau de monopólio dos mercados etc. Da mesma maneira, a demanda resulta da interação de uma série de forças sociais, que vão da distribuição da renda até a possibilidade que tenham as pessoas de sobreviver produzindo para a própria subsistência. Quando se aplica o método analítico a esse fenômeno (o preço do feijão), o economista diz: constantes todos os demais fatores… Quando se percebe essa diferença epistemológica, compreende-se sem dificuldade que em economia o conhecimento científico, isto é, a possibilidade de se verificar o que se sabe e de utilizar o conhecimento para prever (e, portanto, para agir com maior eficácia), não pode ser alcançado dentro do quadro metodológico em que vem atuando a chamada “economia positiva”.
No esforço de estabelecer um diálogo entre as ciências sociais, Fernand Braudel (1992 [1959], p. 43), no artigo clássico História e Ciências Sociais A Longa Duração argumenta, com base em sua concepção dos tempos históricos que a longa duração seria “indispensável a uma metodologia comum das ciências do homem.” Nesse empreendimento, Braudel não descartava a utilização de métodos quantitativos como guia e suporte para a formulação de modelos empíricos, na verdade ele estava preocupado com o efeito do tempo sobre estas representações. Braudel (1992 [1959], p. 68) dizia que “os modelos eram de duração variável: valem o tempo que vale a realidade que eles registram”. Deste modo, modelos não são atemporais nem aespaciais. Portanto, não são universais. Nesse sentido, os modelos estatísticos podem se mostrar estatisticamente significativos tanto no tempo quanto no espaço. Além disso, não há por que insistir em uma espécie de culto ao nível de significância quando sabemos que ao minimizar a probabilidade de cometer o erro do tipo I (quando a hipótese nula verdadeira é rejeitada) podemos dizer que estamos praticamente maximizando a probabilidade de cometer o erro do tipo II (quando uma hipótese nula falsa não é rejeitada).
Ao observador social, insistia Braudel, o tempo, a duração, “é primordial, porque, mais significativos ainda que as estruturas profundas da vida, são seus pontos de ruptura, sua brusca ou lenta deterioração sob o efeito de pressões contraditórias”.
Nesse sentido, Braudel (1992 [1959], p. 68) propunha que:“… a pesquisa deve ser sempre conduzida, da realidade social ao modelo, depois deste àquela, e assim por diante, por uma sequência de retoques, de viagens pacientemente renovadas. O modelo é assim, alternadamente, ensaio de explicação da estrutura, instrumento de controle, de comparação, de verificação da solidez e da própria vida de uma estrutura dada. Se eu fabricasse [estimasse] um modelo a partir do atual, gostaria de recolocá-lo imediatamente na realidade, depois fazê-lo remontar no tempo, se possível, até seu nascimento. Após o que, calcularia sua vida provável, até a próxima ruptura, segundo o movimento concomitante de outras realidades sociais. A não ser que, servindo-me dele, como de um elemento de comparação, eu o faça passear no tempo ou no espaço, em busca de outras realidades capazes de se iluminar graças a ele, com uma luz nova.”
Influenciado tanto por Polanyi como por Braudel, Wallerstein (1974) também se vinculou a este empreendimento de repensar as ciências sociais herdadas do século XIX. Wallerstein liderou, no âmbito da Comissão Gulbenkian (1996), um trabalho de revisão dos fundamentos epistemológicos das ciências sociais a partir das críticas às fronteiras disciplinares, ao falso sentido de universalidade e à validez de distinção entre as “duas culturas”. Wallerstein et al. (1982) insistiam recorrentemente sobre a indisponibilidade de dados ajustados à economia-mundo capitalista como unidade de análise. Embora de inegável valor, as estatísticas econômicas, políticas e sociais coletadas em nível nacional, subnacional, domiciliar ou individual têm certas limitações na medida em que ignoram, entre muitos aspectos: a) a espacialidade das atividades econômicas através do tempo; b) a não correspondência entre as fronteiras estatais e as atividades econômicas; c) o caráter relacional das atividades econômicas. Sabe-se também que são relativamente escassas as comparações sistemáticas sobre as mudanças que as reversões dos ciclos de Kondratiev provocam nas zonas centrais, periféricas e semiperiféricas, como também são raras as comparações metódicas através do tempo, principalmente na longa duração.
Portanto, o projeto de abrir as ciências sociais, no sentido acima descrito, nos remete necessariamente à utilização combinada das complementares fontes informacionais qualitativas e quantitativas. Não seria concebível adotar procedimentos eficazes e eficientes, coerentes com esse esforço, sem a consideração simultânea e sinérgica de ambas as abordagens metodológicas. Tanto o esforço de conceituação de sistemas classificatórios e de estratificação quanto o de conciliação de prioridades não poderiam ser obtidos de forma razoavelmente fidedigna sem o uso articulado destas duas bases informacionais. Trata-se de explorar uma espécie de espiral progressiva simbiótica e, portanto, virtuosa, entre ambas, onde uma abordagem gera elementos e resultados que dinamicamente nutrem a outra. Em outras palavras, assumimos o pressuposto de que estudos quantitativos exigem estudos qualitativos prévios que desenvolvem conceitos e apontam variáveis (ou ao menos necessidades de mensuração), ao passo que análises de interesse teórico necessitam em diversos momentos de evidências estatísticas para distinção de detalhes sutis e decisivos de comportamento social (valores, expectativas e ideologias).
Para atender a este propósito, é necessário conceber uma abordagem que pressupõe e envolve análises amplas o suficiente para conter a dinâmica dos processos de mudança social (estruturas nas quais as múltiplas contradições se realizam e revelam), a qual só é possível através de um enfoque metodológico robusto o bastante para identificar padrões histórico-mundiais de continuidades e rupturas. O esforço de descrever as realidades sociais através de conhecimento codificados com base em números e indicadores, sem mácula do quantiativismo, possui o poder de influenciar o processo de tomada de decisão acerca das políticas púbicas de forma mais assertiva, uma vez que condicionam e estão condicionadas pelos níveis de expectativas e probabilidades de eventos futuros. Um exemplo desta possibilidade de compreensão mais completa (ou ao menos mais próxima disto) se observa no processo de recondução de cientistas sociais a lançarem mão da exploração de frequências, tendências e relações causais que as bases de dados (cada vez mais amplas e estruturadas) admitem, visando entender os diversos e complexos riscos e oportunidades do avanço da mercantilização da vida.
Diante da discussão apresentada, que é mais ampla e profunda do que neste breve ensaio foi caracterizado, entendemos que o esforço de superação das fronteiras disciplinares, além da revisão dos fundamentos epistemológicos das ciências sociais como proposto por Polanyi, Braudel, Furtado e Wallerstein, requer também uma integração das diferentes bases informacionais. No entanto, tal processo precisa necessariamente ser orientado à proposição de formas alternativas de emprego das métricas, métodos e metodologias de mensuração e estimação existentes, de modo que se mostrem mais adequadas às necessidades de análises histórico-mundiais, tornando-as assim mais robustas. Isto, porém, deve ser conduzido sob o indispensável mais alto nível de rigor metodológico que o senso de responsabilidade e a aplicação fidedigna requer. Só assim, tanto a descrição do passado quanto as eventuais previsões do futuro feitas a partir de recortes da realidade (no tempo e no espaço), habilitarão os cientistas sociais à identificação das decisões sociais relevantes. A proposição de intervenções estratégicas eficazes na busca da erradicação (ou ao menos mitigação) dos fenômenos não desejáveis a partir de uma compreensão que amplamente possa ser considerada sustentável (socialmente justa, ecologicamente correta, culturalmente aceita e economicamente viável) depende disto. Decisões essas que não estão livres de viés, mas que não podem nos deixar esquecer que o custo do erro pode ser socialmente interpretado como sendo o mais caro.
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O enfoque regional ganhou destaque após o final da Segunda Guerra Mundial a partir da temática do crescimento desigual e das consequentes desigualdades socioespaciais envolvidas no processo de reconstrução dos países. Dentre as principais contribuições destacam-se Perroux (1950, 1969), Hirschman (1958) e Lipietz (1977). Na América Latina, esta temática reverberou sobretudo nos estudos da Comissão Econômica para o Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CEPAL) que não apenas concebeu o esquema centro-periferia (Prebisch 1986 [1949]), como também buscou elaborar tipologias dos padrões de desenvolvimento a partir de uma perspectiva sistêmico-mundial, como observado em Sunkel e Paz (1970). Visando complementar este quadro analítico, do ponto de vista dos sistemas de dominação, destaca-se as situações de dependência de Cardoso e Falleto (1984 [1970]) e, do ponto de vista da dinâmica da renda, os aportes de Celso Furtado (2003 [1959], 2007 [1969]). Destaca-se também as contribuições de Marini (1973, 1974). No tocante aos diálogos do debate latino-americano sobre o desenvolvimento com a Análise dos Sistemas-Mundo ver Santos (2011, 2016, 2018). Para ver aplicações da Análise dos Sistemas-Mundo a partir do enfoque regional ver Moraes (2000) e Becker e Egler (2003).
Giovanni Arrighi e Jéssica Drangel (1986) propuseram uma definição operacional para identificar a estratificação mundial da renda a partir do comando econômico dos países sobre os benefícios globais da divisão mundial do trabalho. A metodologia proposta consiste essencialmente em calcular a distribuição de frequência do percentual da população mundial por intervalos de renda, suavizada através da média móvel de três intervalos do log da PNB per capita. A distribuição modal resultante permite inferir através do tempo o esquema clássico centro-periferia proposto pela CEPAL (1949), bem como verificar a existência e estabilidade da zona semiperiférica conforme sugerido por Wallerstein (1974). O CWEdata aplica está técnica aos dados de renda e população estimados pelo Maddison Project Database (2020).
Onde,
year = Ano;
Country = País;
pop = População (em milhares);
perpop = Participação relativa do população do país X no total da população mundial (%);
gdppc = PIB real per capita (em US$ de 2011);
log_group = Intervalo de classse do logarítimo do PIB real per capita (em US$ de 2011) ao qual o país X pertence.
O poder econômico relativo expressa o diferencial da renda per capita do país selecionado em relação a renda per capita do Estados Unidos, ou seja, face ao poder hegemônico durante o ciclo sistêmico de acumulação estadunidense. Através desse índice infere-se a distância relativa da apropriação de excedente mundial do país selecionado em relação a apropriação da renda pelo país hegemônico em diferentes momentos do tempo.
O Índice de Complexidade Econômica (ECI) é uma medida de classificação do desenvolvimento econômico dos países elaborado por Hausmann e Hidalgo (2014) que tem base o grau de diversificação e o nível de intensidade tecnológica da pauta de exportação. Países complexos são países que apresentam capacidades de produzir e exportar uma grande diversidade de produtos intensivos em conhecimento, refletindo, de um lado, as capacidades competitivas do país na economia mundial, e, por outro, a capacidade de comando econômico dos países sobre os benefícios globais da divisão mundial do trabalho.
O CWEdata propõe ordenar o ECI dos países por intervalos do log do PIB per capita. A distribuição resultante permite descrever o caráter desigual de integração dos países (e das regiões) na economia-mundo capitalista. Além de revelar para cada período a diferença de complexidade econômica entre países que pertencem ao mesmo extrato de renda, pode-se observar também a semelhança de complexidade econômica entre países de renda relativamente distantes. Por outro lado, segmentando os dados por região (continental e subcontinental), o gráfico de dispersão resultante revela as semelhanças e diferenças nas e entre as regiões dos níveis médio de complexidade econômica e de renda.
CWEdata é uma Aplicação Web que tem por objetivo integrar diferentes fontes de dados, estruturados em linguagem relacional (SQL) orientadas por critérios territoriais e temporais, com o propósito de gerar informações histórico-mundiais sobre a economia mundial e o sistema internacional.
A CWEdata pretende colaborar com as iniciativas já existentes no âmbito da Análise dos Sistemas-Mundo de produção de novas estatísticas, visando oferecer uma alternativa ao nacionalismo metodológico (cf. Vieira 2015), e que permitam repensar o processo de desenvolvimento e os mecanismos de reprodução das desigualdades (cf. Arrighi and Drangel 1986; Hopkins and Wallerstein 1982; Korzeniewicz and Moran 2009).A principal distinção da Análise dos Sistemas-Mundo em relação às demais perspectivas é sua insistência em que a unidade de análise deve ser o sistema-mundo, definido em termos de processos e conexões econômicas, e não unidades definidas em termos jurídicos, políticos, culturais, geológicos ou com base em qualquer outro critério.
O sistema-mundo em que vivemos, a economia-mundo capitalista, é definido simultaneamente por fenômenos espaciais e temporais. Espacialmente ela é composta por diferentes zonas econômicas cuja localização tende a se deslocar com o tempo, redefinindo sua geografia. Temporalmente, está sujeita aos ciclos de 50-60 anos, um Kondratiev, que se transformam em padrões estruturais seculares. Não obstante, sabe-se que não existem dados mundiais, pois as estatísticas econômicas, políticas e sociais são exclusivamente nacionais, subnacionais, domiciliares ou individuais. Embora de inegável valor, elas têm certas limitações na medida em que ignoram: a) a espacialidade das atividades econômicas através do tempo; b) a não correspondência entre as fronteiras estatais e as atividades econômicas; c) o caráter relacional das atividades econômicas. Sabe-se também que não existem comparações sistemáticas das mudanças que os ciclos provocam nas zonas centrais, periféricas e semiperiféricas, como também não existem comparações sistemáticas através do tempo, principalmente na longa duração. Neste sentido, o esforço de abrir as ciências sociais (cf. Sciences. 1996), também deve ser um empreendimento de orientar as pesquisas empíricas em direção à elaboração de dados em nível da economia-mundo, e à comparações mundiais no espaço e através de longos períodos. Para tanto, há dois grandes obstáculos: disponibilidade de dados e disponibilidade de teorias. São os desafios que fazem o conhecimento avançar. Os esforços nessa direção têm recorrido a diferentes técnicas como análise descritiva bivariada (Arrighi & Drangel 1986; Taylor 1987, 1988; Korzeniewicz and Awbrey 1992; Karatasli 2017), análise de cluster (Lima, 2007; Souza and Ouriques 2019), análise de redes (Snyder and Kick 1979; Kick et al. 2000; Kick and Davis 2001; Kick et al. 2011; Nemeth and Smith 1985; Smith and Nemeth1988; Peacock 1988; Rossem 1996; Smith and White 1992; Arend 2017) e até mesmo análise discriminante (Dezzani 2001, 2002). Nós acreditamos que estas iniciativas precisam ser levadas a sério. A aplicação web CWEdata se junta a esses esforços e, através da produção de análises empíricas alternativas de caráter histórico-mundial, objetiva ser um espaço colaborativo e de debate em direção à superação obstáculos acima mencionados. A CWEdata parte das estatísticas nacionais, que são submetidas a operações metodológicas para delas revelarem propriedades sistêmicas da economia-mundo capitalista. Para tanto, a aplicação apoia-se em técnicas quantificadoras, não em quantitativismos. Recorre-se à quantificação e a outras técnicas de análise estatística para medir relações ou descobrir novas relações através de medidas ou equações matemáticas, que não são um fim em si, mas meios para pesquisas qualitativas. Nem todas as variáveis relevantes para as ciências sociais são mensuráveis. Quando são, frequentemente apresentam diferentes graus de dificuldades para sua estimação. As variáveis podem ser contínuas ou discretas, nominais, ordinais, intervalares ou proporcionais. Cada uma requer um tipo de aproximação. “A quantificação não altera, absolutamente, as condições qualitativas das coisas; simplesmente as submete a outo tipo de operações”, lembra o historiador Júlio Aróstegui (2006). Para descrever os processos de desenvolvimento da economia-mundo capitalista a Análise dos Sistema-Mundo sustenta que é preciso reagrupar os dados existentes para identificar diferenças nos padrões de acordo com: a) as zonas centrais, periféricas e semiperiféricas; b) os movimentos cíclicos de longo prazo; e c) a fase secular em que se encontra a economia-mundo capitalista.As diferentes fontes foram integradas em um banco de dados onde as tabelas fato estão relacionadas simultaneamente ao espaço e ao tempo de modo que sejam possíveis consultas relacionadas, permitindo modelagens multidimensionais da economia e do sistema internacionais.
A aplicação web CWEdata foi programada em linguagens R e SQL, que permitem a elaboração de painéis funcionais e interativos, com os quais mesmo usuários não familiarizados com técnicas estatísticas avançadas podem explorar dados e interpretá-los a partir de análises pré-definidas. Já os usuários avançados podem colaborar com o desenvolvimento da aplicação solicitando acesso ao banco de dados.
Para a realização do projeto CWEdata foram integradas diferentes fontes de dados, reunindo-se em um único banco informações em escala mundial sobre território, população, uso da terra, trabalho, renda, índices de desenvolvimento humano e de complexidade econômica.
Para conhecer em detalhes as origens e os conteúdos dos dados incorporados à plataforma acesse a Lista de fontes e os metadados.UN, Statistic Division. Standard country or area codes for statistical use (M49).
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University of California Press.O CWEdata é produto do projeto de extensão desenvolvido pela Universidade Federal de Santa Catarina intitulado “Desenvolvimento Orientado por dados: uma visão histórico-mundial da economia e do sistema internacional” e tem por objetivo produzir e disseminar informações e conhecimentos estratégicos que possam suprir parcialmente os déficits de capacidades da estrutura de governança do setor público catarinense no que tange ao conhecimento da realidade internacional necessária à formulação de estratégias de desenvolvimento de longo prazo. Para tanto, o projeto se propõe à:
Palavras-chave: Dados em Painel; Ciência de dados; Desenvolvimento Econômico; Relações Econômicas Internacionais; Desigualdade; Relação centro-periferia.
Estudantes e gestores públicos que atuam nas áreas de desenvolvimento regional e/ou assuntos internacionais das secretarias estaduais e municipais de Santa Catariana.
“Pensar globalmente, agir localmente” talvez tenha sido o slogan mais verbalizado e defendido pelos gestores públicos preocupados em promover o desenvolvimento regional catarinense nas últimas três décadas. Em estudo recente, professores do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSC (CARIO et al., 2019), destacaram que a estrutura produtiva da economia catarinense enfrenta um processo de mudança estrutural: setores tradicionais encadeados com a agropecuária e a produção florestal estão cedendo espaço para indústrias de média e alta tecnologia e para o setor de serviços intensivos em conhecimento. Esta transformação, que se diferencia do movimento geral de desindustrialização da economia brasileira e se aproxima das experiências bem-sucedidas dos países desenvolvidos, ainda não se completou e aponta para o aprofundamento do desequilíbrio regional expresso no fenômeno da “litoralização”. Como estratégia de desenvolvimento local, o Plano de Desenvolvimento Santa Catariana 2030 recomenda a promoção da economia do conhecimento para as regiões ainda apoiadas em setores tradicionais. Além disso, o estudo sugere que a estratégia de crescimento econômico de Santa Catarina deveria se “descolar” do Brasil e se integrar ao mundo através da internacionalização da sua produção seja através da atração de empresas multinacionais, seja através de investimentos externos das empresas catarinenses (GOVERNO DE SANTA CATARINA, 2018);
Uma economia regional integrada ao mundo também é uma economia mais exposta à dinâmica competitiva mundial e, portanto, sujeita aos movimentos políticos e econômicos internacionais. Como se movimentar dentro deste cenário de modo que as conquistas históricas de elevação das condições de vida catarinense não sejam revertidas por estratégias de desenvolvimento fracassadas? Maximizar as possibilidades de êxito do SC 2030 requer um tipo de capacidade de governança da política pública apoiada em informações estratégicas de caráter histórico-mundial que, muitas vezes em seu cotidiano, o(a) gestor(a) público(a) não tem tempo para sistematizar. O presente projeto de extensão visa suprir esta lacuna através da produção e difusão de informações e conhecimentos estratégicos a partir do uso integrado de tecnologias de informação, de análise estatísticas, bem como de teorias econômicas e das relações internacionais, contribuindo deste modo para o movimento data-driven development (WORLD BANK, 2018).
Desde a reforma do Estado em 1994, a estrutura estatal brasileira tem sofrido sucessivas modernizações institucionais com o objetivo de conter o clientelismo e conferir maior racionalidade à escolha pública (BRESSER-PEREIRA; SPINK, 1998). Não obstante, a modernização da estrutura de governança de estados e municípios se faz mais difícil devido às crescentes demandas sociais, ao endividamento público progressivo e ao déficit de capacidades da gestão pública. O grau de endividamento dos estados limita a disponibilidade de recursos financeiros para a promoção de políticas ativas de desenvolvimento de longo prazo. A ausência de autonomia constitucional para executar políticas monetária, cambial e externas favoráveis à integração econômica mundial reduz os graus de liberdade da economia catarinense em relação à economia brasileira. Os déficits de capacidades nas estruturas de governança limitam a identificação de oportunidades de desenvolvimento. Neste sentido, o projeto de extensão se justifica na medida em que pretende suprir parte do déficit de capacidades disponibilizando acesso a informações estruturadas e conhecimentos especializados em linguagem acessível ao público não-especialista.
Produzir e disseminar informações e conhecimentos estratégicos que possam suprir parcialmente os déficits de capacidades da estrutura de governança do setor público catarinense no que tange ao conhecimento da realidade internacional necessária à formulação de estratégias de desenvolvimento de longo prazo.
BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos; SPINK, Peter. Reforma do Estado e administração pública gerencial. Rio de Janeiro, RJ: FGV Editora, 1998.
CARIO, Silvio Antonio Ferraz; NICOLAU, José Antono.; CARVALHO JR., Luiz Carlos De; BOPPRÉ, Norton Flores (ORG.). Caracteristicas econômicas e sociais de Santa Catarina no limiar do século XXI. Criciúma: UNESC, 2019. Disponível em: http://repositorio.unesc.net/handle/1/7663.
CONNOLLY, Thomas; BEGG, Carolyn. Database systems: a practical approach to design, implementation, and management. 6a ed. Essex: Pearson, 2015.
GOVERNO DE SANTA CATARINA. Plano de Desenvolvimento de Santa Catarina 2030. Florianópolis. Disponível em: http://www.spg.sc.gov.br/visualizar-biblioteca/acoes/plano-catarinense-de-desenvolvimento/1162-plano-sc-2030-versao-final/file.
HOPKINS, Terence K.; WALLERSTEIN, Immanuel. Patterns of development of the modern world-system. Review (Fernand Braudel Center), p. 111-145, 1977.
WORLD BANK. Information and Communications for Development 2018: Data-Driven Development. [s.l.] : The World Bank, 2018. DOI: 10.1596/978-1-4648-1325-2. Disponível em: http://elibrary.worldbank.org/doi/book/10.1596/978-1-4648-1325-2. Acesso em: 15 jun. 2019.
Duas décadas atrás, mais precisamente, em 1999, começou a ser estudada no Departamento de Economia da UFSC a perspectiva de análise inaugurada com o lançamento, em 1974, do primeiro volume de O Moderno Sistema Mundial de Immanuel Wallerstein. De 1999 a 2003 as obras seminais de Fernand Braudel, Giovanni Arrighi e do próprio Wallerstein foram debatidas em encontros semanais que reuniam professores e alunos de toda a UFSC. Em 2003, os professores Nildo Ouriques e Pedro Vieira organizaram um grande seminário internacional que contou com a presença de Immanuel Wallerstein, Giovanni Arrighi, André Gunder Frank e Theotônio dos Santos, entre outros.
Quando o mestrado em Economia se organizou em áreas, os professores Hoyêdo Nunes Lins, Pedro Vieira e Wagner Leal Arienti, interessados na Economia Política dos Sistemas-Mundo (EPSM), passaram a integrar a área de Transformações do Capitalismo Contemporâneo e os seminários foram transformados nas disciplinas: Capitalismo e História, que pretendia ser uma iniciação à EPSM; O Brasil no moderno sistema mundial; e Metodologia da Pesquisa em Análise dos Sistemas-Mundo.
Em 2006, foi formalmente constituído o Grupo de Pesquisa em Economia Política dos Sistemas-Mundo (GPEPSM ), com registro no CNPq. De cunho acadêmico, o GPEPSM tem por finalidade estimular e promover a elaboração, o emprego e a divulgação da EPSM como marco analítico para o estudo da mudança social em nível mundial, regional e local. Com esta finalidade, em 2007, o GPEPSM realizou em Florianópolis o I Colóquio Brasileiro em Economia Política dos Sistemas-Mundo, evento que vem acontecendo anualmente. Além da UFSC, onde o Prof. Helton Ouriques tem sido o organizador, o Colóquio ocorreu em outras universidades brasileiras: UnB, sob a coordenação dos Prof. Antonio Brussi em 2009 e dele com o Prof. Jales da Costa em 2017; Unicamp em 2011, por iniciativa do Prof. Eduardo Barros Mariutti; UNESP-Marília em 2012, organizado pela Profa. Rosângela Vieira; e UFPB em 2015, coordenado pelo Prof. Jales da Costa. Para fomentar um debate internacionalizado, os Colóquios contam frequentemente com palestrantes estrangeiros entre os quais se destacam Beverly Silver, Carlos Aguirre Rojas, Chistopher Chase-Dunn, Ho-Fung Hung, Ravi Palat e Roberto Patrício Korzeniewicz.
As chamadas de trabalhos tem sido respondidas por docentes, doutorandos, mestrandos e graduandos de todo o Brasil, e mesmo do exterior, o que demonstra que os Colóquios vem cumprindo seu objetivo de proporcionar aos pesquisadores interessados na EPSM a oportunidade, talvez a única fora dos EUA, para socializar suas pesquisas com quem está genuinamente interessado na Perspectiva.
Além do Colóquio, a produção de livros, capítulos de livros, artigos, teses, dissertações e monografias dá testemunho de que nos 14 anos de sua existência o GPEPSM vem contribuindo para construir e divulgar a EPSM no Brasil e para mostrar a relevância da Perspectiva para a compreensão do mundo contemporâneo, especialmente do Brasil e da América Latina.
Atualmente o GPEPSM está vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da UFSC e conta com uma rede de pesquisadores no Brasil (UnB, UNESP, Unicamp, UFGD, UFSM) e nos EUA (University of Maryland). Os esforços de pesquisa se encontram hoje orientados para a construção uma explicação histórico-mundial dos processos de ascensão e rebaixamento dos países/regiões na hierarquia mundial de poder e da riqueza do sistema-mundial moderno.
Realizações passadas e futuras só podem ser consideradas positivas se funcionarem como alento para a continuidade da missão: oferecer uma perspectiva crítica e fecunda para a compreensão da economia-mundo capitalista, compreensão que é a condição indispensável para qualquer projeto de mudança na direção de um mundo democrático e igualitário. Para isso, o principal desafio do GPEPSM será sua contínua renovação enquanto movimento do saber comprometido com a construção de uma ciência social historicamente fundamentada e aberta através da incorporação de novas gerações de pesquisadores e pesquisadoras.
Fábio Pádua dos Santos
Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSC
Luan Pires Fisher
Mestrando em Relações Internacionais
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